A diferença entre ciência e brincadeira é anotar.
— Adam Savage
Não é justo
Uma das imagens que mais me marcou quando eu era um jovem estudante do catecismo e frequentava a igreja perto de casa era o de umas senhorinhas que vestiam uma faixa — usadas no mesmo estilo que a faixa presidencial brasileira, atravessada no peito — só que a faixa era roxa e em vez do Brasão da República havia um “Coração de Cristo” feito de linha, mas 3D, como um broche. Não eram muitas, mas eram extremamente devotas e estavam sempre lá. Eu fui até procurar no Google o nome desta faixa e fiquei surpreso ao descobrir que, aparentemente, era uma faixa específica daquela igreja, daquele grupo de senhoras. Aquelas faixas me passavam uma sensação meio irreal, como se eu estivesse em um filme ou em um mundo paralelo. Tanto que lembro delas até hoje, 35 anos depois.
Esta imagem voltou para minha cabeça quando outro dia uma amiga (e leitora aqui da newsletter) contou a história de quando ela estava desesperada porque precisava contar para a avó que não ia casar na igreja. Ela descreveu a vó como muito católica, das que ia para a igreja todo dia e, pronto, no meu teatro da mente eu botei uma faixa roxa com um coração 3D no peito da velha.
Minha amiga tinha seus motivos para não querer casar na igreja, mas fez uma grande preparação para contar para a vó, a quem ela respeitava muito e não queria ver triste. Pediu ajuda da mãe e lá foram dar a notícia.
A avó, é claro, não gostou. Achou um absurdo aquilo tudo, como podia isso, o casamento na igreja é Deus abençoando aquele encontro. Um tempo depois, mais calma, a senhora explicou o seu desespero. “Eu faço a minha parte, rezo e vou à igreja todo dia. Eu vou pro céu, mas lá não vou encontrar a minha família e vou ter que passar o resto da eternidade sozinha.”
Esta história é maravilhosa porque eu me identifico totalmente com ela. Menos a parte de ir para igreja todo dia, é claro. Uma das frases que eu mais devo ter usado na vida em momentos de desespero foi “mas não é justo”.
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