O fim do início das redes sociais

Escritores se parecem com cozinheiros: criamos pratos imaginativos com o que está na geladeira, na prateleira, ou adquiridos no mercado, ou em nosso próprio jardim. Juntamos coisas díspares e fazemos delas algo novo e (torcemos) inesperado. Como o cozinheiro, estamos sintonizados com os outros — queremos que nossas criações sejam compartilhadas; em certo sentido, nossas criações não existem a menos que sejam compartilhadas.
Joyce Carol Oates

É o fim de uma era ou estou apenas envelhecendo? — é assim que a escritora americana Ann Friedman aborda o “pós social” na newsletter dela da semana. A resposta é: sim. Talvez as redes sociais como conhecemos e vivemos tenha sido apenas um grande delírio millennial. Não é que elas deixem de existir ou até mesmo ter importância. Só não vamos mais viver lá 24 horas por dia. Estamos ficando velhos e os novos jovens (a Gen Z) tem uma relação bem diferente com redes sociais, criada em cima do seu característico cinismo contrastante com o hiper-otimismo dos antecessores. A Gen Z parece acreditar que se a internet vai mudar o mundo, definitivamente não vai ser para melhor.

este artigo da Bloomberg usa a expressão “saturação”. Eu gosto de pensar em um tipo de diáspora digital. A gente até queria viver em uma única rede social. É mais prático. Mas ela, a vida, nos empurra para a fragmentação e agora vamos vagar pelo mundo em busca de um solo para chamar de pátria. Sempre sonhando em voltar para onde tudo começou.

Certa vez falei em um antigo do podcast sobre os círculos do Google Plus, um mecanismo onde em cada post diríamos para qual círculo social ele iria. Dava muito trabalho. (Além disso, a decisão ficava na mão de quem publica, não de quem lê. Não que isso seja bom.) No pós-social vamos abrir o app “social” específico para o tipo de conteúdo que queremos consumir. “Social” entre aspas porque outra coisa que define o pós-social são os apps como TikTok e até YouTube, que apesar dos criadores adorarem usar a expressão “essa comunidade querida” são mais de entretenimento do que sociais. Ou será que uma caixa de comentários é tudo o que precisamos para ter uma rede social?

Estes dias andei pensando muito na expressão “cultura de internet”. Era como o BuzzFeed ou o YouPix se descreviam. Adoro. Não posso dizer que “fui criado” nessa cultura (pois quase idoso) mas foi o “lugar” onde mais me encontrei. (sim, hoje a newsletter está cheia de aspas) A cultura da internet era a celebração da grande piada interna que era viver online. O cyberespaço, ou metaverso. Era um mundo que viva completamente separado do físico, onde as pessoas eram handles e nicks. O meme do “meu alívio é saber que assim que eu sair da frente dessa tela, este assunto sequer estará sendo cogitado como uma discussão de verdade na vida real”. Como uma coisa boa, é pra ser assim mesmo. Mas está acabando. O Twitter (não, eu não vou usar o tal “novo nome”) vai acabar sendo o reduto desta cultura. E tudo bem.

Sempre vejo por aí notícias do tipo “uma indústria que gira X quaquilhões de dólares por ano”. Live shopping. Influencer marketing. IA. Mas no mundo da comunicação-como-emprego a internet mais destruiu valor do que criou. Prédio da Editora Abril, estou olhando para você. Longe de mim defender a Editora Abril, mas era um prédio inteiro de salários pagos. A internet tornou as revistas e jornais obsoletos. As tais das redes sociais substituiriam, mas agora vemos que não ficou nada no lugar. Ninguém vai voltar a comprar revista agora que o Twitter acabou. Quer dizer…

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