Como ser um alienado seletivo

Pessoas são como estômagos, sabe? Elas podem processar parte do que você dá para elas, mas se enchê-las demais, rápido demais, eventualmente tudo vai escapulir para fora.
Brandon Sanderson

Esta semana eu tive o início de terapia mais estranho da minha “carreira”. Depois dos “oi, tudo bem?” e “você está me ouvindo? peraí, deixa eu fechar o whatsapp” de sempre, minha terapeuta mandou: “Eu estou muito curiosa para saber o que você está achando da história do submarino.” A minha resposta pegou ela de surpresa: “Que submarino?”

Assim com eu fiz com ela, vou contar uma coisa para você: já tem muito tempo que parei de acompanhar o noticiário chamado quente, do dia-a-dia. Eu tenho um link para o G1 bem na barra de favoritos do meu navegador, mas ele tem uma função bem específica: é o meu link a internet caiu?. Não é que eu nunca abra o G1, é só que não acompanho as notícias, porque entendi, na minha cabeça barulhenta, que isso é perda de tempo. As notícias passam, os fatos se desenvolvem. Esta postura ficou mais entrincheirada ainda quando finalmente consegui sair do Twitter. Se antes eu me informava por lá (do jeitinho que só o Twitter faz por você) agora eu me informo pelos outros — nem que seja pela minha terapeuta. E vou dizer: eu até que sei o que está acontecendo no mundo, de resultados de eleições globais a bilionários desaparecidos.

Não é que eu me isole completamente do mundo, especialmente no tema “mídia e tecnologia”. Inclusive uma das minhas primeiras brincadeiras com o ChatGPT foi escrever um bot que pega os links mais populares do meu servidor de Mastodon e me manda no Telegram — é só que tem semanas, com foi esta, que eu nem vou lá ver. Eu me informo não com uma abordagem doomscrolling “ó não, o que será que vai acontecer agora?” e sim “hmmm, que interessante, o que será que vai acontecer agora?” — daí minha preferência por mídia e tecnologia, áreas onde eu tenho interesse porque sim, porque acho divertido olhar para o passado e pensar no futuro. Eu leio sobre os acontecimentos do momento sobre o Reddit, IA, aquisições e fusões… Até porque se não fosse assim esta newsletter não existiria.

É claro que essa “alienação seletiva” nem sempre funciona — 2018 a 2022 foi um bom teste para esta abordagem, se é que você me entende — mas parte do livramento foi entender que usar o doomscrolling como arma é uma das estratégias mais usadas (e eficientes) do momento. Donald Trump, Jair Bolsonaro e agora Elon Musk se colocam na mídia todo dia, monopolizando a conversa e ficando sempre no ataque. Falamos disso em 2021 aqui na newsletter, de como na política na era-das-redes-sociais o melhor ataque é o ataque, mesmo que isso seja incentivar rinha de bilionário. (viu? eu sei o que está acontecendo)

Meu ponto é: não se preocupe. As notícias chegam. Eu sei o que está acontecendo, não sou um alienado. Com a invenção das redes digitais (mesmo antes da internet em si) nos venderam a ideia de que informação é poder. Que precisamos saber tudo agora para, assim, tomarmos decisões rapidamente e nos beneficiarmos com isso. Pode ser verdade se você é investidor da bolsa de valores assistir CPI ao vivo (como certos amigos meus fizeram esta semana) não serve à informação mais, sim, ao espetáculo.

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